01/04/2016 16h17 - Atualizado em 01/04/2016 16h17

Transformar o Brasil com lucidez - Por dom Reginaldo Andrietta, bispo de Jales

Artigo publicado na página da Diocese de Jales - (http://diocesedejales.org.br/)

O tempo pascal que estamos iniciando nos propõe superar frustrações e dependências que experimentamos, especialmente na vida política de nossa nação, hoje. Inspiram-nos duas transformações: uma realizada por Cristo na vida dos discípulos de Emaús (cf. Lc 24,13-35); outra, realizada por Pedro, em nome de Jesus, na vida de um mendigo (cf. At 3,1-10).

Os discípulos de Emaús vivem uma experiência decepcionante. Para eles, a libertação que ansiavam para Israel, por meio de Jesus, diante do poder imperialista que os dominava, não teve sucesso. Sua morte representa a derrota de seu projeto. Eles regressam para casa frustrados. Jesus ressuscitado se revela neste contexto, sem ser reconhecido.

No entanto, a Palavra das Escrituras, partilhada por Ele, aquece seus corações. Ao cair da tarde, convidam-no para se hospedar com eles: “Fica conosco, pois é tarde e a noite já vem”. Jesus entra e, de hóspede passa a ser anfitrião, pois é Ele quem os serve à mesa. O evangelho diz: “Sentou-se à mesa com os dois, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e distribuiu-o”.

Ao ser reconhecido nesse gesto, Jesus desaparece, significando que a partir da sua morte e ressurreição a comunidade vive a experiência da sua presença por dois sinais: a Palavra e o Pão partilhados, uma alusão clara à Eucaristia. Os discípulos de Emaús, então, cheios de entusiasmo, voltam a Jerusalém, testemunhando com encantamento o que presenciaram.

Essa transformação gerada por Jesus é a mesma a ser permanentemente realizada em nossas vidas: libertar-nos de nossas frustrações diante de um projeto de sociedade justa que ainda não se realiza neste país, para crermos na possibilidade de uma vida pessoal e social plena de sentido, testemunhando nossa alegria de termos a Cristo como garantia de vitória.

O livro dos Atos dos Apóstolos mostra outra transformação, realizada desta vez na vida de um mendigo, por meio de Pedro, representando a comunidade cristã. O homem que pede esmola na porta do templo representa seres humanos que dependem dos demais para sobreviverem: não têm autonomia, não são livres, não são plenamente humanizados, vivem a experiência da humilhação. Devem ser objetos de caridade ou tratados como sujeitos com direitos?

A resposta vem de Pedro. Ele ajuda o mendigo a “caminhar com suas próprias pernas”, promove-o, restituiu sua dignidade, propondo-nos como questão: o que fazer diante da pobreza e dependência de tantos? Nossas ações devem ser exclusivamente assistencialistas? Certamente, não. Assistência sem promoção humana, sem inclusão social, perpetua a dependência. Nossas ações devem, enfim, promover participação cidadã, com repercussão urgente na vida política.

Sejamos sábios diante das frustrações vividas em nossa nação, tendo cuidado, sobretudo com os profissionais da política que defendem interesses particulares e corporativos, apoiados por poderosos meios de comunicação, manipuladores da opinião pública. Eles nos mantém excluídos e dependentes. Saibamos, portanto, utilizar canais de informação que nos ajudam a ter uma visão política mais esclarecida, para que possamos também atuar com lucidez.

Deixemo-nos, finalmente, transformar por Cristo Ressuscitado, conscientes da necessidade de participarmos mais livremente e plenamente nos destinos de nosso país, com a certeza de que conseguiremos também transformá-lo radicalmente, desde que acreditemos nessa possibilidade e atuemos com lucidez evangelizadora, comunitária e política.

Jales, 30 de março de 2016.