06/11/2016 07h49 - Atualizado em 06/11/2016 07h49

"A Profecia do Desembargador Alves Braga""

Com a colaboração do leitor do site: José Gilberto Alves Braga Junior - Juiz de Direito da Comarca de Santa Fé do Sul.

Em 1995, o então Corregedor Geral de Justiça do Estado de São Paulo e meu saudoso tio, Des. Alves Braga, escreveu texto abaixo para o jornal Tribuna do Direito, edição de junho de 1995, p. 09. Hoje, denomino suas palavras de "A Profecia do Des. Alves Braga". Vale a pena ler.

“Uma comunidade anárquica"
“Observa Robert Moss, in O colapso da Democracia, que ‘a inflação foi usada para destruir a classe média. O fato de a inflação parecer escapar ao controle não foi um erro administrativo, mas sim uma consciente estratégia política. Compreendemos que o poder econômico é a chave para o poder político, o que é a própria essência dos ensinamentos marxistas-leninistas. O primeiro passo é restringir o setor privado: continua-se com a redistribuição da riqueza através de uma taxação progressiva do imposto de renda, a seguir imposto sobre bens, imposto sobre presentes e assim por diante; continua-se com o confisco de terras e a encorajar os operários a tomar conta das firmas, sob qualquer pretexto que se tenha em mãos; certifique-se de que a inflação, deflagrada por você mesmo, não atinja seus próprios partidários, mas sim seus inimigos sociais, e terminará com o controle pelo estomago. Estamos praticamente atingindo o estágio em que, segundo afirma Trotsky, a oposição será uma espécie de ‘lenta inanição’.

Estas observações, tiradas da obra citada, são do primeiro ministro britânico, quando essa técnica usada levou, com a eleição do Chile, os marxistas ao poder. A tática deu certo e Allende chega à Presidência da República, ‘democraticamente’. Mas a anarquia que se instalou no país levou ao trágico fim daquele governo que, com seus métodos, dividiu, abastardou e amesquinhou a nação.

O exame dessas circunstâncias, que hoje envolvem o País, exige ponderação. Não está o Brasil a caminhar a passos largos para a república sindicalista, sonhada pelas esquerdas? Já não se sente instalado no País o governo das minorias, que entendem que quanto pior melhor, usando todos os meios para desrespeitar a lei e as instituições? Não assistimos a forças antagônicas disputando o poder, como quem disputa o espólio de casa roubada? O crime organizado, com vínculos além fronteiras, não pretende manter governo paralelo, em afronta e desrespeito às autoridades constituídas?

Os sindicatos, salvo poucas exceções, dirigidos por homens despreparados, quando não mal-intencionados, usam da massa trabalhadora sem nenhuma orientação, como instrumento de manobra a desafiar os governos. Conhece a massa a intenção de seus líderes? Lembremos de março de 1964, quando o povo foi às ruas pedir o fim da anarquia.

Uma coletividade que se arroga o direito de usufruir da liberdade sem limites, de não se submeter a nenhuma autoridade, nem mesmo ao império da lei, é uma comunidade anárquica. É o domínio do espirito libertário que leva a adjetivar a liberdade de absoluta.

A Revolução Francesa, entre seus males, trouxe em seu bojo o conceito moderno de anarquismo. O Estado é encarado como opressor e as autoridades como agentes da repressão. O anarquismo não aceita nenhuma autoridade ou ideologia. A lei, na sua concepção, é o instrumento de opressão na mão dos ricos e poderosos contra os pobres. Na mão do patrão capitalista contra o proletário, como se todo pobre ou proletário fosse virtuoso e todo capitalista ou rico fosse canalha.

Na raiz do anarquismo está a rebeldia. O anarquista é sempre um rebelde, não necessariamente violento, mas contestador não pacífico.

Na sua conduta há sempre a marca da beligerância contestatória. O Brasil parece não recolher a lição da história e quer trilhar o mesmo fatídico caminho.

A Constituição de 1988, no seu delírio libertário, tangida por ideologias exóticas, não bem digeridas e manipuladas por políticos despreparados e inescrupulosos, reduziu o Estado a nenhuma expressão e ignorou a Nação. A consequência está aí para quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir.

O direito de greve é confundido com instrumento de força política e não arma de defesa do direito do trabalhador. Sob qualquer pretexto, as falsas lideranças das massas, para exibir força política, frente ao poder público, promovem greves e passeatas, arregimentando inocentes úteis para engrossar essas manifestações, criando a impressão, no espectador desatento, de que representam todas as forças populares.

A greve no serviço público desserve a população, que se vê privada dos serviços essenciais e muitas vezes urgentes, como os da saúde, segurança, justiça, ensino, transporte público etc... Não se deve olvidar que se presume essencial todo o serviço publico, já que a essencialidade é que justifica a existência de serviço prestado pelo Estado.

Ao conceito de greve, entretanto, dá-se grande elastério e o Estado tolerante assiste impassível à instalação da baderna e da anomia no País. O presidente da República é recebido com pedras. O governador do Estado é alvejado a ovos.

A síndrome da cidadania, inoculada pelos conceitos da Constituição de 1988, tornou o indivíduo arrogante. Em seu nome cometem-se crimes contra o Estado e a sociedade, invocando sua condição de cidadão para fazer e dizer tudo o que quer e não o que pode, sem ser atingido pela lei.

Os protestos são sempre acompanhados de desnecessária violência às pessoas e ao patrimônio. O anarquista, contrariado, vai protestar bloqueando rodovias, destruindo o que resta da pavimentação das malcuidadas estradas. Danifica-se o patrimônio público e não se tem noticia de que essa minoria ativista haja respondido a processo por dano à coisa pública.

A população carcerária, a pretexto do excesso de contingente, destrói, incendeia os presídios. Faz reféns utilizando de seus funcionários e de circunstantes ali encontrados no momento da rebelião. A despeito de fazer cinco refeições por dia, às custas do erário, portanto do contribuinte, não aceita a sanção que lhe é imposta pelo crime cometido. Quer reconhecida sua liberdade absoluta até para atentar contra a vida, a liberdade e o patrimônio de suas vitimas.

O argumento do excesso de população carcerária é mero pretexto. Há, sim, uma orquestração para destruir os presídios até que não haja onde se recolherem os infratores, que passarão a gozar da desejada liberdade absoluta. O excesso de população não é, na verdade, o que afeta o preso. Em regra, são indivíduos que, em liberdade, vivem em barracos ou habitações coletivas, abrigando muitas pessoas em pequenos cubículos. Não se tem notícia de que esses delinquentes tenham sido responsabilizados pelo dano causado ao próprio do Estado ou que tenham respondido pelo crime de constranger, sob ameaça, seus reféns.

A vida de um povo gravita em torno dos critérios, dos moldes, dos exemplos das figuras e dos segmentos representativos de sua sociedade. Vale dizer, como anotava Alberto Torres, que a sociedade modela o indivíduo. Uma sociedade em dissolução não tem o que oferecer ao indivíduo e esse povo será a projeção de seus dirigentes e de suas lideranças.

Os fenômenos sociais, em si, não tem grande significação. Eles se projetam à medida que o observador investiga sua gênese e sua projeção. O importante é saber qual a causa geradora do fenômeno e quais seus reflexos na sociedade. Essa pesquisa é que ira orientar o legislador na elaboração de leis; o juiz, na sua aplicação. E a elite dirigente terá condição de conhecer a verdadeira dimensão dos problemas nacionais e encontrar, nesse estudo, a forma de correção dos rumos, sem ignorar as lições implacáveis da história.

O Poder Judiciário inicia, ainda que parco de recursos, a instalação, em todo o Estado, dos Centros de Estudos da Escola Paulista de Magistratura, não como vitrina de vaidades, mas como forma de preparar as novas gerações de magistrados para o perfeito desempenho de suas funções, sem dirigismo ideológico, mas como a caixa de ressonância dos anseios de uma sociedade que sente o despreparo das gerações que se sucedem, fruto do abandono, não só pelo poder público, como da omissão da própria sociedade, acostumada a esperar que por ela o faça o Estado. É o excesso de igualdade e o excesso de liberdade que liquidam as democracias, que ignoram que o ‘homem é a medida de todas as coisas’.”


Desembargador Antonio Carlos Alves Braga